Vil no sentido mesquinho e infame da vileza


Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo.
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó principes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Fernando Pessoa

Alta Patente

Saí da entrevista da segunda fase de um processo de recrutamento para uma empresa/ função que é mesmo, mesmo, mesmo aquilo que eu procuro nesta fase da minha vida, com a profunda sensação de que nunca uma entrevista (e já fiz bastantes) me correu tão mal. Foram tantos tiros ao lado, Jesus! Só ao recordar tenho esta sensação de vergonha-própria que me corróiiiiii! Ao terminar a entrevista, entrevistada e e entrevistadores de alta patente despedem-se. "Até breve, espero", diz a alta patente. "Até à próxima." E despede-se dizendo, "Eu já percebi que a Filipa é uma lutadora, tem grandes coisas à sua frente", entendi eu algo como, "A Filipa vai ser óptima, mas ainda não é!" ou ainda, pior, "Não se sinta mal por ter atirado ao pé vezes sem conta, vai ter mais oportunidades na sua vida.". "Ciau", pensei eu, optando por não mostrar que domino o italiano.

Passa ao próximo e não ao mesmo.

Há Tempo

Quando me cruzei com este artigo AQUI, intitulado "Why My Family Doesn't Do Sleepovers", pensei, antes mesmo de o ler, "Oh, não! Da série: Tem andado a fazer tudo errado na educação do seu filho, temos aqui uma teoria novinha em folha para o fazer sentir mal!". Honestamente, pachorra para cada teoria! Mas, como a curiosidade matou o gato, não só li o artigo, como dei por mim, no fim, a concordar.

No fundo o que é dito no artigo, é que uma criança a dormir fora de casa, em casa de amigos, está muito mais exposta ao perigo de abusos sexuais. Não necessariamente por parte dos pais dos amigos, mas irmãos mais velhos, primos, amigos dos amigos. Nesta parte do artigo, eu disse, baixinho e só para mim!: menos, minha gente, menos! Na verdade, eu não conheço nenhum caso próximo de abuso sexual, e assim que me recorde, nem afastado. Sei que existe, obviamente! Eu não conhecer não significa que não exista. Não estou fechada na caverna, e isto não é uma alegoria. Sei que é (deve ser, acredito que seja!) um marco terrível na vida de uma criança. Mas, felizmente, é uma realidade que tenho bastante distante. Apesar de ser muito apologista do não há (ou há poucos) bons seres humanos, também não acredito que hajam assim tantos maus (ou tão mesmo maus!). Eu nunca fui assaltada, não tenho medo de sair à rua fora de horas, mas também sei que não devo andar com a carteira escancarada, ou meter-me em becos escuros à noite. Acho que, como em tudo, impera o bom senso.

Evitar que os filhos durmam em casa dos amigos dado o perigo de abuso sexual, parece-me exagerado - ao melhor estilo do permanecer em casa para evitar ser atropelado. Quando eu não devia ter mais de 10 anos, teria eu uns 8 anos, talvez, morava em Tomar. Uma cidade pequenina, amorosa, onde se vivem muito intensamente os acontecimentos da cidade (é uma vida de vila, um pequeno burgo que é cidade porque a Rainha Dona Maria II amaaaaavaaaa a vila e fez dela, no século XIX, justamente, cidade). Uma vez tomarense, a camisola do Nabão, tudo nos diz respeito. Um prédio antigo ruiu no centro da parte antiga da cidade (para quem possa conhecer, ao lado da Rolisport, perto do Café Santa-Iria! - ontem foi dia de Santa Iria em Tomar, btw! Alguém se lembra disto?!), um senhor mui antigo, dos seus noventa anos, estava justamente sentado no seu trono (vulgo pia, retrete ou sanita), quando a casa desabou, tendo o homem vindo do segundou ou terceiro piso aterrar no rés do chão agarrado às calças. Desta lição da minha infância, eu retiro um lema, que embora não absoluto é importante: quando é para acontecer desgraça, ela acontece em qualquer lugar.

Agora, voltando ao artigo, houve um aspecto que me fez pensar. Em criança, passar a noite em casa dos amigos é uma excitação. Lembro-me perfeitamente de que quando isso acontecia, eu ficava impossível de alegria. Eu e as minhas amigas faziamos planos, apresentávamos umas às outras o resto das nossas vidas além do que era passado na escola. A casa, a família, os hábitos, o cão, o gato, os brinquedos. Brincar em casa dos amigos era óptimo, passar a noite em casa das amigas era o auge. Mas ao lado desta excitação lembro-me que também sentia outras coisas, sentia que aquela família tinha rotinas e hábitos diferentes dos meus e que isso era estranho (não estou a falar de ninguém acordasse à meia noite para jogar Trivial Persuit, mas o espaço era diferente e com ele os hábitos). Eu sentia-me na posição de convidada, queria ser prestável, educada, não incomodar, por isso sei que se precisasse , por algum acaso, de pedir socorro (porque me doia a garganta, porque tinha frio, ou o que fosse), eu não o faria. Finalmente, sei que se as minhas amigas me dissessem que era normal fazer alguma coisa, eu aceitaria. Se os irmãos mais velhos me acordassem para, estou a excluir, redondamente, as questões dos perigos de abusos sexuais, fazer um disparate qualquer - sei lá ir brincar para o sotão ou trepar ao telhado, eu dificilmente me oporia, não teria discernimento suficiente para saber se aquilo era algo normal para aquele contexto. Por isso, sim, acho que as crianças são frágeis e vulneráveis. Cabe-me proteger os meus filhos, rodeá-los e dar-lhes veículos de amadurecimento sem que para isso os coloque em posições de fragilidade. Não faz mal nenhum tratarmos as nossas crianças como crianças e esperar que cresçam. Há, espera-se, tempo para tudo. Existe, para tudo, o momento certo. Há que respeitar o tempo de proteger, preparar e ensinar


P.S.: É óbvio que as minhas crianças ainda não dormem em casa dos amigos. Quanto muito em casa dos avós e não há problema nenhum.

Quem Diz é Quem é

No carro, pela manhã, a caminho desde a Linha periférica até à Lisboa metrópole, para a nossa família, porque simplesmente não conseguirmos estar nos sítios a horas de outra maneira, por muito que gostássemos de ter uma carrinha familiar que deixasse cada um no seu destino, são precisos dois carros para nos transportar. Lisboa está caótica, quarta-feira demorei, de carro, 55 minutos (pacientemente contados de um em um!) do Marquês à 5 de Outubro.

Como estamos no trânsito à mesma hora em dois carros, temos o hábito de nos telefonarmos, e, em alta-voz fazemos deste um momento de tagarelice familiar. Tão querido. O Lourenço, apesar de mal falar português (tão mal! - mas melhor a cada dia), já tem aulas de inglês. E, por isso, vinhamos a revisitar a matéria (o Lourenço tem 3 anos!).

Pai: Como se diz um em inglês, Lourenço?
Lourenço: One.
Pai: Muito bem! E agora como se diz dois em Inglês?
Lourenço: Hmmm... Four!
Pai: Não, filho! Dois é two!
Lourenço, ultra-escandalizado: Não!!! Dois é o Pai!!

Can't stop laughiiiiingg!

Sai um Nobel para os States

Well... Well... Well... Longe, longe de mim ser uma papa Nobeis. Mas o Bob Dylan ganhou o Nobel da Literatura. E eu ainda não me consegui decidir se concordo ou não!

 É que é isto que eu adoro na arte, tudo pode ser qualquer coisa desde que o sintas very deeply. A versatilidade da arte, a transmissão da emoções pelos canais tradicionais muito para além do que é esperado de uma comunicação tida por básica.

Mas ele há tantaaa literatura melhor que a do Dylan. Ele tem frases incríveis, tem! Mas literatura?!


I consider myself a poet first and a musician second. I live like a poet and I'll die like a poet.
O Bruno Vieira do Amaral, no Observador, explicou bem a coisa. Aqui.

Crowdfunding

Não parece, mas eu tenho aqui uma pequena costela empreendedora. Ora, vejamos, ontem à noite, assisti ao Shark Tank português e fui testemunha de um caso de sucesso extraordinário. Um senhor de setenta e seis anos, se não me falha agora a memória, conseguiu arrecadar não só fantásticos elogios, como ainda, pasme-se minh'alma, dinheiro pela extraordinária invenção de uma mesa que consegue ser, ao mesmíssimo tempo, nada mais nada menos que uma mesa. Uma mesa cadeira. Um trambolho, que eu não queria nem que me oferecessem. Portanto, se lhe deram dinheiro a ele, também me podem dar dinheiro a mim. Está claro que eu preciso de mais um bocadinho. Mas não sejamos tio-patinhas nesta hora. A outra que comprar casas não é um investimento, porque a casa já está feita. Eu não concordo.

Passados tempos e tempos de horrivel vai e vem, da cidade para a periferia, e da periferia para a cidade, ninguém aguenta!, em conselho de família, eu e o meu esposo decidimos que é hora de mudar. Deixamos a Linha, deixamos o mar, a brisa marinha e a marginal que serpenteia congestionada, por um local perto dos empregos, perto da escola dos miúdos. Tendo a decisão sido tomada, eis que falta o essencial. A nossa próxima residência, digamos que temos tudo preparado para entrar já amanhã para uma qualquer casa que caiba no orçamento de uma jovem família da classe média (ela estrabucha, mas cá vai sobrevivendo!, a classe média). Mas parece que a casa que precisamos simplesmente não aparece, e o tempo vai passando, passando, passando... Até que eu vi ontem os sharks a investirem na mesa-cadeira e se fez luz. Crowdfunding. Entrepreneur. É só desempenhar o meu papel. Portanto, senhores Angels que leiem esta Gigante, que devem ser para cima de meia dúzia, não se acanhem. Em troca de um milhão de euros (sim eu sei que ninguém dá nada a ninguém portanto eu tenho que dar alguma coisa em troca) eu terei um sorriso estampado no rosto, o que só pode ser uma mais-valia para o mundo, prometo chegar a todos os compromissos a horas, prometo ser bem comportada, não me enervar com os meus filhos, não me enervar com o meu marido. Isto soa um bocado como se os Angels fossem o Pai Natal, mas I don't care, se o financiamento vem do Polo Norte ou da China tanto me faz, contando que chegue.

Um milhão de euros a mim chega-me, (para verem como eu sou modesta, com tanta casa gira por aí de dois milhões para cima eu contento-me com uma casinha de um milhão)! Ainda se aceitam contribuições para os impostos (grandes ladrões!) e porque uma casa não se quer despida, conto investir tudo o que sobrar num serviço de decoração à séria, não vamos encher uma casa deste calibre de IKEA, que parece pecado.

Como sou querida, e gosto que os meus Angels se sintam envolvidos no projecto, ainda os permito escolher entre:


Hipótese A: Um magnífico T3 na Avenida António Augusto Aguiar, por 970 000,00 euros, num edifício estupendo, que recupera a traça antiga sem descurar a contemporaneadade.
 



Hipótese B: Um estupendo T3 em plena Avenida da Républica (desconsidere-se o dito do Almeida Garret sobre Viscondes e Barões), por 920 000,00 euros, temos um edifício do século XIX. Pronto e é isso. Um edifício que é um espanto, do século XIX na Avenida da Répública. Senhores Anjos, eu não tenho preferência, mas este cai muito bem.




Posto isto, estou ao dispor.

Grab them by the p***y!



Já temos o Putin, na Rússia. O Kim Jong-un na Coreia do Norte. Já despachamos o Fidel, o Estaline, o Hitler, o Sadam. Precisamos mesmo, mesmo de mais uma dor de cabeça?!